quarta-feira, 1 de setembro de 2010

{Histórias} Dreams - Primeira noite


“Estenda tua mão, princesa. E meu Reino será teu.”

“Tudo bem, repassando. Número um: meu pai acha que eu sou idiota. Número dois: ele acha que consegue mudar isso. E número três: vou ser obrigada a enfrentar aulas de valsa aqui, no próprio salão do castelo. Claro que ele não podia esquecer-se de fazer a inclusãozinha social dele e convidar também os criados e serventes. O único detalhe que atrapalha um pouco é, além deles, a nobreza será representada por... Eu, eu mesma e mim mesma.”

A garota suspirou, dirigindo um olhar entediado aos presentes. Uma velha empertigada em seu espartilho que serviria como professora, alguns garotos e garotas nos trajes mais simples possíveis e também alguns pais curiosos que ousavam colocar os pés no salão nobre do castelo. A tutora pigarreou, dirigindo-se ao meio do salão e batendo palmas algumas vezes na tentativa de chamar atenção.

- Quero todos fazendo uma fila, meninas de um lado e meninos do outro.

“Uau, idéia genial, madame.” Chutando a barra de seu longo vestido azul-celeste, lá se foi a pequena princesa, colocando-se atrás de todas as outras meninas, que haviam conseguido seus lugares através de uma correria desenfreada e desorganizada. Quase com resignação, ela arrumou o tecido de cetim em seu próprio corpo, as mãos delicadas trabalhando com rapidez. O tempo parecia passar depressa enquanto ela executava sem dificuldades toda sorte de exercícios pedidos. Foi então que a professora adiantou-se mais uma vez até o meio do salão, batendo palmas novamente, o que fez com que todos aqueles espalhados pelo ambiente se calassem, olhando-a atentamente.

- Agora, rápido, cada um com seu par. – a senhora respirou, espantada, vendo que quase todos já tinham um companheiro – Alice, você ainda está sozinha? Alguém vá lá com ela.

Alice, a princesa, enrolando uma das mechas dos seus cabelos cor de mel no seu dedo indicador, mais uma vez perscrutou com o olhar todo o local. Para ela, todos eram feios, chatos, ou qualquer coisa que fizesse com que não fossem os parceiros ideais para seu bailado. Porém, parecendo obedecer à ordem da tutora, um rapaz um pouco mais bem apresentável que os outros se destacou de seu grupo, dirigindo-se a passos firmes até ela, que por sua vez, prendeu a respiração. “Será que...” E a frustração tomou conta de seu corpo, vendo que o garoto desviava de sua rota, pegando pela mão a menina que se encontrava bem ao seu lado. Soltou o ar devagar, munindo-se de paciência. Uma coisa era certa: estava sem par. E sendo assim, deveria recolher-se ao canto da sala.

Optou para aproximar-se do piano onde, para sua surpresa, um amigo de brincadeiras estava sentado. Seu nome era Henry e seu olhar era gaiato, e sua voz sapeca ao se dirigir à Alice.

- Hey, hey... Está sem par?

- Hunf... É o que parece, não?

- Bom, eu, por acaso, estou livre agora, então...

- Tudo bem, tudo bem, quer ser meu par?

Vitorioso, o menino estufou o peito, segurando as mãos de Alice com uma voracidade sem tamanho. Seus olhos denunciavam o que não demorou muito para acontecer. Repetidas e repetidas vezes suas mãos deslizavam de onde deveriam originalmente estar para lugares muito menos decentes. A pequena irritava-se cada vez mais, recorrendo a beliscões e chutes que pareciam não surtir efeito, de mesmo modo que ninguém no local parecia notar a estranha briga. Seus olhos e seu rosto ardiam em chamas, divididos entre a vontade de ser respeitada e a moral que seria cabível manter. E como para tirar-lhe as dúvidas, duas mãos ágeis e respeitosas tiravam-na das mãos profanas de modo tão rápido que ela até ficava sem fôlego. Para reanimar-lhe, o cheiro suave de seu salvador penetrava-lhe as narinas, fazendo com que seus olhos castanhos piscassem algumas vezes antes de finalmente poderem observar, encantada, o rapaz seu salvador enquanto ele pronunciava calmamente algumas palavras ao outro.

- Desculpe pequeno, mas agora ela é meu par.

- Q-q-quem é você? – as palavras custavam-lhe a sair da boca, ainda acostumava-se com a radical mudança. Era mais do que óbvio de que aquele bem apessoado rapaz era de origem nobre, diferente de todos os outros ali.

- Sou teu cavalheiro, princesa. Mas pode me chamar de Henry.

- Ah, graças. E onde está seu corcel, nobre cavalheiro? – finalmente era capaz de retrucar algo a seu modo, bem-humorado e sagaz, por mais que a semelhança de nomes entre os dois garotos a perturbasse.

- E que importa um corcel a ti?

- Hmm, deveras perspicaz. Não me importa um corcel, o que importa é que agora tenho a ti, e que chegou a boa hora. Por acaso não és um mago ou vidente?

- Não o sou, mas se quiseres, poderei tornar-me teu vidente. – Os olhos negros sorriam como se fossem devorar a alma de Alice. O rapaz puxou a mão dela, encostando seus lábios na mesma. A princesa sorriu.

- Ora, cavalheiro, não crês que é audácia de mais?

- Princesa Alice... – E então ambos foram tomados de algo maior que a convenção, que a etiqueta social, algo maior que eles mesmos. Levado por aquele sentimento, Henry seguiu com seus lábios toda a trilha rósea que o levava até os lábios da moça, onde sem resistência, este encontrou um recanto onde repousar com suavidade. Todos estavam espantados, mas para o casal que girava no centro do salão, todos eram nada, eram apenas uma mera coincidência dentre tantas que as levaram a ficar juntos, daquela forma, destinados a serem eternamente Rei e Rainha.

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