quarta-feira, 1 de setembro de 2010

{Histórias} Dreams - Quarta noite


"Se você fosse capaz de ler meus pensamentos, nunca mais ficaria tão longe de mim.”

Seus olhos passavam e voltavam a passar cada rosto, cada corpo, cada pessoa que andava para além das lentes de seus óculos. Ela já podia sentir os olhos se molhando, as mãos apertavam freneticamente um saquinho de amendoim quente que havia comprado há pouco tempo. Suas faces coraram, seu pé batia descompassadamente no chão, estava visivelmente nervosa. “Será que ele vai demorar?” Voltou a repassar os rostos. Ela tinha a impressão de que as camisetas pretas saltavam à sua vista, como se todos ali tivessem combinado de vestir-se com aquela cor apenas para confundir-lhe. Balançou a cabeça negativamente, ao mesmo tempo espantando aquela idéia e tentando conter algumas lágrimas. “Acalme-se, acalme-se. Você acha isso só porque é uma camiseta preta que você está procurando. A resposta está em seu cérebro.”

Conformando-se, voltou a sentar no banco de cimento que estava logo atrás de si. Foi quando, ajeitando-se no lugar, seus olhos captaram algo. Uma pessoa, que ela tanto procurava. O mundo pareceu parar. A única coisa que se movia, devagar, em sua direção era aquele rapaz. Ele vestia uma calça jeans com tingimento escuro, uma camisa preta em que os dois primeiros botões encontravam-se abertos e a gola levantada e, nos pés, tênis comuns. Andava devagar, os olhos negros em uma constante procura. Quase frustrado, levou sua mão aos cabelos bagunçados quando finalmente a viu. A garota, sentada no banco.

Ainda enlevada por tê-lo finalmente encontrado, ela sorriu, no que foi seguida pelo rapaz que andou mais depressa a fim de alcançá-la. Ele apontou o saquinho de amendoim que ela carregava, logo proferindo algumas palavras em um tom baixo e levemente rouco, inebriante.

- É amendoim?

- Uhum. – Ela assentiu com a cabeça, estendendo-lhe o pacote. – Quer?

O garoto limitou-se a rir, pegando um pouco do amendoim. Aos poucos ambos iam se descontraindo, rindo, e andando por entre as barracas daquela feira começavam a conversar como se de fato se conhecessem há tempos. O tempo passava rápido para os dois amigos, que se divertiam apenas por estarem em companhia um do outro.

- Hey, Linda, você pode me esperar aqui?

- Claro, mas aonde você vai, Ed?

- Hmm, ao banheiro, eu acho que você não vai gostar de vir junto.

Ela riu um pouco e assentiu com a cabeça. De fato, não seria uma boa idéia. Mas assim que ele se afastou a insegurança tomou conta de seu corpo, fazendo com que ela balançasse a cabeça negativamente algumas vezes. “Calma, calma. Não há nada que possa acontecer agora.” Mas estava errada. Surgindo de uma de trás de uma das barracas da praça, Timmy foi aproximando-se como um abutre circundado sua presa. Junto a ele, Johnny e Sebastian, dois garotos que tinham tanto músculo quanto não tinham cérebro. Timmy era dois anos mais velho do que Linda, e insistia em dizer que a amava. Ela duvidava muito daquilo, afinal de contas, não era muito possível que o cara que dizia que a amava a infernizasse sempre, todos os dias. E mesmo ali, ele conseguira encontrá-la. A garota ergueu as sobrancelhas, tentando entender o que exatamente o garoto queria. Logo obteve a resposta. Sem o menor escrúpulo ele agarrou seus pulsos, aproximando seu rosto do dela.

- Quem era ele?

- Eu não te devo explicações, Timmy. – Apesar de sua situação, ela era bem capaz de ser incisiva.

- Me diga, quem é ele?! Vocês têm algo?!

- Nós não temos nada. – E a voz escapou-lhe por entre os lábios em forma de um sussurro. – Ainda.

Para cobrir o alvo rosto de Linda com um enorme rubor, Edward acudiu ao grupo exatamente quando ela pronunciara aquela palavra. Mas, aparentemente, ele não ouvira. Estava ocupado de mais distribuindo socos entre os três garotos, e apanhando também. Porém, Ed tinha a técnica que Timmy, Johnny e Sebastian simplesmente não tinha, o que fez com que os três fugissem em uma corrida frenética. Sentiam-se derrotados. A garota de olhos claros procurou os olhos de seu amigo, encontrando rodelas roxas envolta deles. Com urgência verificou uma porção de cortes em sua pele. Um instinto protetor invadiu-lhe o peito, fazendo-a improvisar alguns curativos. No momento em que seu instinto se foi e o menino notou o que fizera, suas bochechas coraram-se de vermelho vívido.

- N-não precisa me ajudar, não foi nada, Linda.

- Foi, com certeza. Você me salvou. – Revirou os olhos – Nem Deus sabe o que ele seria capaz de fazer...

Sua voz tornou-se reticente e ela notou o olhar de seu acompanhante sobre o seu. Pegou-se pensando como seria tocar naqueles lábios, ter aquele garoto só para si. Tentou balançar a cabeça a fim de espantar aqueles pensamentos, mas foi incapaz de fazê-lo. Estava imobilizada pelo desejo, pela curiosidade. Edward também não se movia, parecia coberto da mesma aura hipnótica. Seus lábios moveram-se, emitindo palavras quase inaudíveis.

- Eu... Quero você para sempre...

Mas seus lábios não foram capazes de dizer mais nada. Envolvidos em um cálido beijo, sentiam-se mais confortáveis ali no meio da multidão do que se sentiriam em uma ilha deserta. Já não importava mais o mundo, a opinião alheia, muito menos Timmy. Ela o queria ali, naquele momento. Mesmo que ela soubesse que ele não seria eternamente seu, mesmo que o coração dele algum dia se prendesse à outra pessoa, aquele beijo, aquele único beijo era um novo começo. Um novo começo para seu novo coração.

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